Imagine a manchete do dia mencionando a diferença de 2 pontos a favor do candidato X: “disputa apertada”. No dia seguinte, outra pesquisa eleitoral mostra o candidato Y na frente, por 2 pontos, gerando novo destaque: “reviravolta com Y na dianteira”. É um exemplo de como o tratamento jornalístico dos resultados das pesquisas não tem sido adequado. No caso, a margem de erro apontava empate entre os concorrentes tanto na primeira como na segunda rodada. É muito comum, nas matérias sobre pesquisas, ignorar-se o impacto dos erros amostrais. Outro caso clássico é o do exagero: “candidato Z cresce 100% em uma semana”. Tinha 1% e atingiu 2%.

Em que pese a falta de conhecimento da mídia para publicar resultados de pesquisa, a questão preocupante é outra. Na composição de títulos e conteúdos tenta-se persuadir o leitor eleitor ao invés de informá-lo? A desconfiança nos meios de comunicação é antiga. Eles representam interesses próprios, de grupos dominantes, de anunciantes e da sociedade. Por vezes, acentua um deles. A hipótese vai se confirmando a cada novo período de disputa por cargos eletivos: grupos de comunicação, sim, buscam influenciar o processo de escolha de candidatos.

A forma usual de participar do jogo político é a de enfatizar a “corrida de cavalos”, usando da pesquisa para indicar quem está vencendo e criando uma armadilha informacional ao omitir o fundamental: quem são os candidatos em si. Suas qualidades, atributos, realizações e competências repousam em segundo plano. Os debates, raros, oferecem a chance do eleitor conhecer as ideias e o significado da filiação ideológica dos concorrentes. Contudo, mal conduzidos, em horários nada nobres e com controle dos minutos de voz - fracassam. Para os mais interessados, miseravelmente, resta a mídia social: Fake-Book e Go-Go.

O comparativo entre as coberturas noticiosas europeias e americanas, pelo número expressivo de eleições das últimas décadas nessas regiões, revela posturas diferentes. No primeiro caso, entendem que as pesquisas constituem um valioso instrumento para um jornalismo de precisão. Ao contrário, estudos evidenciam que no modelo americano elas são utilizadas para revelar a evolução da preferência dos eleitores, dando pouco destaque às causas ou ações que a provocaram. Um padrão apreciado pelo jornalismo brasileiro.

Nessa linha, os meios de comunicação esculpem para a opinião pública imagens de candidatos, distinguindo os vencedores dos perdedores, mostrando rotas de ascendência e queda, como numa competição esportiva - dando primazia às variações quantitativas. Poucos são os analistas a oferecer textos substanciosos. Prevalece o superficialismo da computação de pontos, pois a cada nova pesquisa os resultados são comparados com anteriores, com os de outras pesquisas, segmentados em regiões, candidato cotejado com candidato, sendo relembrados os desempenhos e variações numéricas em pleitos anteriores. No final, tal esforço desembocará em outra contagem, a de votos.

Jornalistas europeus, por sua vez, usam os resultados de pesquisas de forma seletiva e equilibrada, primando pela objetividade. Embora esse seja um conceito acatado pelos dois lados, os europeus são mais críticos ao levar em conta as forças e as ideologias por trás da ação política. Na leitura americana, objetividade é sinônimo de neutralidade, para a qual não há espaço em se tratando de disputa pelo poder. Para eles, as campanhas são de políticos e existem para políticos buscarem ascensão, vitória e poder.

No Brasil, o modelo predominante é o americano, “agraciado” com os escândalos e as divergências entre resultados de pesquisas, proporcionando um caldo para a cultura de candidaturas que, semeadas, crescem sem raiz e caule, sem origem e natureza e que despontam apenas pela divulgação de números duvidosos.  Adquirem posições virtuais discutidas e questionadas, exaustiva e bravamente, no transcorrer de toda campanha.

De fato, as respostas das dezenas de questões feitas aos entrevistados são desconsideradas nas reportagens. São elas que revelam as atitudes dos eleitores, mas acabam cedendo lugar aos eventos dos candidatos, basicamente subida ou declínio. Excepcionalmente ocorrem explicações para as variações, pífias, sustentadas por estereótipos negativos: ele é pouco carismático, aparenta estar doente, é corrupto, não tem energia, é feio, não sabe se expressar. Quando o competidor ganha terreno, o sucesso pode ser justificado pela melhoria da comunicação pessoal ou à mudança de estilo da campanha.

Os meios de comunicação reconhecem que as pesquisas alimentam o interesse dos seus públicos pelas campanhas. A necessidade de pesquisa é tanta que, mesmo com a crise que restringiu a produção das pesquisas, institutos que erraram anteriormente estão de volta como se nada tivesse acontecido, reaplicando os métodos arriscados de medir a opinião pública. A demanda também deu lugar a novas e improvisadas empresas a ousar metodologias não testadas para registro do comportamento eleitoral.

Corroborando com a ideia da fórmula “poder = pesquisa + pena”, cresce o patrocínio dos grupos de comunicação aos institutos de pesquisa, alguns indo além, criando estruturas próprias, tornando-se autossuficientes. A pesquisa tornou-se imprescindível para o exercício do jornalismo, como contribuição à integração de três perspectivas - persuasiva, informativa e objetiva - embora a última não receba o tratamento aprofundado merecido.

Quanto mais o eleitor conhece e compreende o processo eleitoral, por meio de pesquisas confiáveis e de coberturas independentes de fatores emocionais, melhor ele escolhe as lideranças do país. Ao tratar a disputa eleitoral como se fosse um jogo esportivo, a mídia priva o eleitor de fazer julgamento crítico dos candidatos e de tomar decisão racional.

O fato é que, querendo ou não, a mídia transforma as campanhas naquilo que o eleitor já descobriu: são eventos de encenação teatral que, ao lado da propaganda negativa, dos ataques recíprocos e do poder financeiro, acabam desprovidos de seriedade e desservindo a democracia.

Quem escolhe o Presidente, os Governadores e os Senadores? Você ou a mídia?