Falha na comunicação, metodologia controversa e equipes desqualificadas estão transformando pesquisas em caso de polícia.

É inquestionável a relevância das pesquisas destinadas a ajudar a definir as áreas para abertura e fechamento ou para avaliar as melhores práticas de controle da crise viral. Ainda assim, é preocupante o fato da coleta domiciliar de material biológico, para teste, ser realizada simultaneamente com a aplicação de entrevista.

Embora parte significativa da população respeite e valorize esse tipo de estudo, outra parcela revela desconfiança acentuada. Para superar o receio dos moradores mais apreensivos, as equipes de campo justificam as visitas como sendo pesquisa, argumento que ameniza a resistência em recebê-las. A dificuldade surge quando prevalece a incompreensão, transformando as tentativas de abordagem em conflito, alguns resultando em prisões.

Descrição de morador, em jornal de 17 de maio, sobre a forma de abordagem:
Um entrevistador veio aqui em casa, em Goiânia. Chegou um cara a pé com três sacolas e uma mochila cheias de coisas médicas, sem nenhum uniforme nem crachá pedindo pra fazer um teste de Covid. Eu mesmo fiquei desconfiado e mesmo assim o cara não me mostrou um crachá. Colocou o capote, luva, toda a parafernália na frente da minha casa enquanto me explicava muito mal quem o tinha mandado e como funcionava a pesquisa. Um vizinho achou estranho e ligou para a polícia. Nem a polícia sabia o que era.

Não é estranho que a pandemia, no mundo todo, atraia grande interesse dos cientistas. São centenas de instituições governamentais ou privadas indo a campo para recolher material humano para suas análises. Tal quantidade de investigações, e a forma pela qual são conduzidas, passaram a criar intranquilidade na população e, até mesmo, no próprio meio acadêmico. 

Via de regra, as pesquisas precisam ser primeiramente aprovadas por conselhos de ética. No entanto, as formas de realização, adaptadas de outras áreas, envolvendo amostras de grande amplitude, não fazem parte do arsenal de recursos metodológicos usuais no meio biomédico. Isso impede o adequado escrutínio e a compreensão dos seus riscos reais.

Solução existe, a começar pela exigência de pareceres técnicos do ponto de vista das diferentes áreas científicas envolvidas no projeto de pesquisa. Isso necessariamente deve preceder sua liberação, logo seguida de firme auditoria, durante e após a conclusão, para validação dos procedimentos de coleta e os resultados. Acima de tudo, fiscalização das autoridades da saúde. 

Acontecimentos lamentáveis, como os registrados, transformam-se em notícias perturbadoras, a denigrir a imagem da pesquisa como imprescindível recurso para conhecimento, compreensão e solução de problemas.
Parece lixo? Material perfurocortante, apreendido pela polícia, juntamente com entrevistadores.